quinta-feira, 27 de novembro de 2014

FAHRENHEIT 451 - François Truffaut

Ano de Lançamento: 1966
Direção: François Truffaut  
 



O bom no filme de Truffaut é sua eterna busca por questões que afetam diretamente ao homem, como ele faz em Os incompreendidos. Truffaut, em sua trajetória cinematográfica, se arrisca em diversas produções, que vão desde o terror (no terror-charmoso de A Noiva estava de Preto), passando pelo romance (Amor de Adolescente, O homem que amava as mulheres entre outros) e na ficção científica. No último caso, Fahrenheit 451 é uma ótima pedida. Confesso que pouquíssimas vezes assisto ficção científica, confesso, de igual modo, que nunca assisti, completamente, filmes como starwars ou Senhor dos Aneis ou qualquer coisa do gênero (Game of Throne, Harry Potter, Amanhecer etc), é um tipo de filme que não me agrada mesmo; sou fã da realidade, das coisas tangíveis, das relações lógicas entre os seres humanos e suas tensões. No entanto, Truffaut me fez ter que assistir a ficção científica e, como eu esperava, me surpreendeu. Fahrenheit 451 é uma ficção científica no estilo Big-Brother passada num futuro em que as pessoas têm aversão a livros e vivem imersas em uma realidade fantasiosa, criada por um discurso de que o livro só traz divagações, problemas e sofrimentos para a espécie humana; Nessa ideologia, o conhecimento é uma espécie de segregador dos homens, por causa dele é que existem as mazelas sociais e as doenças que acabam com a humanidade, todos os homens têm que ser iguais, ou seja, ninguém pode saber mais do que o outro, situação impossível numa sociedade onde existam livros. Desse modo, a solução para que exista essa hegemonia mental, a queima do livro é uma das principais atividades, atividade essa dada aos bombeiros.
Como se poderia esperar, tal ideologia futurista (que penso ser atual) é uma idea refutada por algumas pessoas, admiradoras do livro e do conhecimento, pessoas que são capazes de sofrer verdadeiros sufrágios e, ainda, perder a vida, em amor a seus livros. Vale mencionar, com isso, que ter um livro, nessa sociedade homogênea, é um crime passível de prisão e destruição dos bens.

A história de Fahrenheit 451 passa-se no batalhão de bombeiros, mais especificamente, com Montag, um bombeiro que está prestes a receber uma promoção e subir na hierarquia do batalhão. Respeitado, verdadeiro crente na ideologia do conhecimento homogêneo, Montag é um carrasco impassível daqueles que possuem livros em suas casas. Agressivo em sua missão, Montag invade inúmeras casas e é quem mais queima livros do batalhão. No entanto, em um dia comum, Montag encontra uma professora no trem que sempre pega para a sua casa, o que vai marcar profundamente seu modo de ver o livro e os conteúdos existentes nele. A professora o indaga e busca as motivações das crenças de Montag, indagações que mexem com a forma de pensar de Montag; Outro fato que o impulsiona suas indagações, é quando Montag presencia uma mulher que desiste da vida e prefere ser queimada com os livros do que viver em um mundo sem livro, isso mexe ainda mais com o bombeiro. Esses e outros exemplos levam Montag a um refletir e escolher seguir essas pessoas que acreditam tanto num ideal.
Truffaut, como sempre, é sutil, é romântico, gosta de atuar com belas mulheres e está sempre levando seu telespectador-leitor a indagar-se sobre a realidade. No filme, o diretor abusa dos efeitos (avançadíssimos para época) e na produção, fazendo um filme futurista e bastante interessante. Geniais as cenas do futuro criadas no filme, de fato, o diretor parece prever o hoje, sobretudo das televisões interativas; o diretor só não conseguiu prever o desenvolvimento do telefone, embora essa seja uma falta lógica, naquele contexto.

Por fim, é interessante notar a genialidade do filme, a interessante indagação que ele nos leva; a todo o momento o telespectador é impelido a indagar-se como seria um mundo sem livros? Como chegaríamos a uma civilização se o conhecimento encontrasse barreiras físicas, como a que é retratado na película? O que seríamos se não pudéssemos ler ou poder decodificar informações? A discussão retratada por Truffaut é atual e serviria como um bom exemplo de sociedade totalitária, que impedem o livre desenvolvimento da informação; serviria também como um emblema para os governos, que se mascaram de democráticos, mas que, no fundo, com o pouco investimento no conhecimento e na informação, acabam por ser totalitárias também e levam muitos ao sofrimento e a verdadeiros feudos modernos.

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

BUFFALO ´66

O filme se passa na fria cidade americana de Bufallo e conta a história de Billy, um jovem com um histórico perturbado por obsessões e paixões que o levaram à destruição. Billy é preso por 5 anos e quando sai encontra a jovem dançarina (Layla, vivida por Cristina Ricci), de quem se torna amigo e cúmplice em um conjunto de mentiras no qual Billy vive imerso. Durante sua prisão, Billy mentiu pra família que estava viajando e trabalhando e tinha uma esposa; na sua saída, Billy liga pra casa dos pais e a mãe exige que o filho leve a esposa para um jantar em sua casa; Billy então sequestra a desconhecida bailarina  e faz com que ela se apresente como a esposa dele para os país. O que poucas pessoas sabem é que Billy tem desejo de morte pelo homem que ele crer ter sido o motivo de sua prisão e tem o desejo de morrer. Billy é um sujeito perturbado, frio e agressivo, tendo uma identidade forjada num conjunto de eventos que marcaram sua infância e sua juventude e por sua fria relação com os pais, que têm comportamentos estranhos. A temática é interessante e profunda, mostra como o homem é resultado de sua história e de sua relação com o outro. O filme mostra que o amor é poderoso para iluminar a vida dos mais infelizes no mundo. O diretor, Vicent Gallo, que é também roteirista e ator principal no filme, mostra talento, com cenas bem montadas e com uma fotografia muito boa. Cristina Ricci está bela e talentosa e dá vontade de ficar vendo.


sexta-feira, 26 de setembro de 2014

CARTA ABERTA AO POVO DO MARANHÃO

Estamos próximos do dia 05 de outubro, data do primeiro turno das eleições no Brasil, no ano de 2014. Este, como os outros, é um importante momento em que a sociedade e o Estado conclama os cidadãos para decidir os rumos do país e dos estados brasileiros. É agora que o cidadão tem tudo para virar o jogo, dizer não à miséria, à fome, à violência que atingem, diretamente, a todos os cidadãos no País. No Maranhão, em vista os últimos acontecimentos, como, por exemplo, fugas do principal complexo penitenciário do Estado, o de Pedrinha, queima de ônibus, assaltos, tráfico, só para mencionar alguns dos problemas que nossa segurança pública passa, esse momento é vital, visto a situação histórica, social e econômica que o Maranhão carrega como um fardo pesadíssimo por longos 40 anos.
Nesse sentido, é válido lembrar que o Maranhão ostenta ainda consigo alguma títulos vergonhosos que, no que parece, o povo que vive no Estado maranhense não se envergonha muito ou se sente pouco incomodado: tais títulos revelam uma prática política digna de estados medievais, como os feudos da idade média, ou ainda, verdadeiras ditaduras, como a da Venezuela e a de Cuba. 
O titulo de última morada das oligarquias, ou, o estado mais pobre da federação (embora viva numa eterna disputa com o Piaui pelo vergonhoso título) revelam um atraso escabroso que alimenta uma máquina assassina, desigual e insaciável. O Maranhão, em pleno século XXI, mesmo com o governo bradando que houve profundas mudanças sociais e econômicas no País, ainda apresenta níveis desumanos de miséria e subdesenvolvimento, contrastando com o quadro de família de propaganda de margarina que o governo apresenta em sua campanha. Insalubridades, valas sujas, escolas depredadas, uma política de ensino que alimenta números estatísticos cooperam para um quadro que se arrasta por séculos no Estado: um feudo onde o Brasil mostra sua cara mais real e mortal, o lugar onde a corrupção se faz sentir por marcas doloridas de falta de assistência do Estado. E o que falar da miséria dos barracos, mendigos e ruas desgastadas? Os Aluguéis sociais na capital não dão conta de mascarar os barracos que se escondem no continente, onde, por certo, famílias passam fome, morrem de cólera e brincam de ir pra escola aprender. Enfim, as situações apresentadas aqui são uma realidade atual, não estamos falando de séculos passados, como, para alguns desavisados, pode parecer.
No entanto, o Estado está mais uma vez diante de um momento importante, que é a mudança de uma politica escabrosa, burra e perigosa, política essa que, em troca dos luxos que o poder oferece ao representantes do povo, é capaz de inventar histórias mirabolantes e golpes de Estados surpreendentes. O povo maranhense tem que despertar, sair da incômoda situação de inércia e de achar que não tem nenhuma culpa diante do quadro que se apresenta. Apelo ao povo do meu estado que não votem nos candidatos que são apoiados pela oligarquia Sarney, vamos Maranhão, mostra pra essa família que não queremos mais, estamos cansados de viver nessa situação, vamos mostrar para o Brasil que não é povo que quer essa situação, não é povo que vota nessa oligarquia. Saíamos de nossas redes sociais e forcemos uma luta corpo a corpo contra a miséria, a corrupção, a falta de saneamento básico, alimentação desnutrida, falta de assistência médica-hospitalar, vamos ensaiar e bradar nas urnas eletrônicas um sonoro NÃO aos 40 anos de vantagem que o Clã Sarney tem sobre nós, digo, mais de 40 anos tirando vantagem de nossa ingenuidade política, fruto de uma política educacional viciante. 
Sonho com um estado rico, onde não necessitemos sair para encontrar coisas melhores, educação melhor, profissionais melhores, sistema de saúde melhor, sonhamos com um dia não precisar passar anos longe de nossa terra, de nossa natureza, de nossas comidas e nossa cultura que é parte de cada um de nós. Vamos, Maranhão, não deixa essa chace passar, vamos lutar, porque é o que nos resta.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

MINHAS MEMÓRIAS DE SÃO LUÍS

"O homem está na cidade
como uma coisa está na outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade" (Ferreira Gullar - Poema Sujo)



Este poema de Gullar representa bem o meu estado de Espírito. Passando dias e dias sem olhar a minha terra querida, sem perceber seu cheiro, seus problemas, sua gente, seu sorriso, seu compromisso consigo e com os seus cidadãos, meu coração entremete-se e respira nas últimas gotas de lembranças, lembranças que tem seu último lugar num livro de Astolfo Serra, Guia Histórico e Sentimental de São Luís do Maranhão, comprado ao singelo preço de R$ 5,00, escondido em um montão de livros sem capa, sem rosto e sem autor, livros, que como as pessoas, brilharam um dia, mas agora, estão renegados ao lixo e ao fogo.
 Fico impressionado como as pessoas amam megalópodes, cidades infinitas, cheias de pessoas sem cara, sem nome, rostos que você vê pela primeira e última vez, violentas massas de seres humanos para quem a vida tem o valor mínimo considerado, pessoas que se esmagam dentro de si e sorriem consigo mesmas; pessoas com pressa, falantes solitárias com um fio ligado a uma bomba guardada dentro da bolsa ou no palito da jaqueta; mas o que mais me deprime, é um outro monte amontoado de gente escura e suja da fuligem que sai do coração financeiro desse lugar, montões e montões de pessoas ávida pelo mínimo pedaço de pão, escuras, escravas e sem alguma dignidade, metendo um medo involuntário em todos que passam em seus possantes carros de marcas europeias, até os jovens temem as peças desse montão sujo. 
Juro que sinto saudades dos ônibus cheios, das ruas escuras, dos buracos do inverno que são um problema à administração pública, saudades das conversas sem sentido, dos sons abertos, das palavras particulares, do calor escaldante, dos olhos julgadores, das matas virgens e grossas e dos lixões da minha São Luís; lamentavelmente, não voltarei até o fim do ano, uma dos golpes mais árduos que minha alma sente em sua existência. De minha memória, pululam lembranças de infância, lembranças de acontecimentos, pessoas, fatos, erros, acertos, amigos, amigas, pessoas que eu vi uma e muitas vezes, lugares particulares, noites de domingo, conversas infinitas e despreocupadas, lembro até do vizinho chato, lembra das ruas, das rotas dos ônibus, das madrugadas, da cama quente, da noite escaldante, do riso dos que me desprezam, até do olhar desconhecido de uma pessoa que passava e num me deu a menor bola, de tudo eu me lembro, sonho todos os dias com essa cidade, lembro todos os dias dela, meus pés estão ávidos para pisar em seu chão, ávidos para sentir seu cheiro úmido e quente como poucos, meus olhos procuram, diariamente, suas matas ciliares e singulares, sua mistura de Nordeste e Norte todos os dias.
Lembro também de sua Avenida Litorânea, Reviver, Rua da Liberdade (leia esse A rua em que as águas são verdes) Bumba-meu-boi, peixe, o feijão mulata gorda da minha cunhada, do arroz com ovo frito, da vinagreira, do maxixe, do pescado no leite de coco e ovo da minha irmã e minha mão, de Quitan, Priscila, Tigrão, Pandora, Raula, Bolota entre outros cachorros que cruzaram minha vida. 
Bem, como eu comecei com uma epígrafe, termino com a representação mais sincera das minhas impressões de onde estou;


Um labirinto místico
Onde os grafites gritam
Não dá pra descrever
Numa linda frase
De um postal tão doce
Cuidado com doce
(...)
Buquês são flores mortas
Num lindo arranjo
Arranjo lindo feito pra você (Crioulo - Não existe amor em SP)

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Fernanda Brum - Ele é Por Mim (DVD Profetizando às Nações)

Já disse milhões de vezes que não sou muito fã da música evangélica produzido pelo mercado fonográfico brasileiro, não é por falta de nacionalismo, mas prefiro o R&B Gospel americano e alguns brancos, como a galera do Jesus Culture; no entanto, no Brasil,  há uma cantora completa e muito boa na voz e na interpretação, que lhes são naturais e poderosas, que é a Fernanda Brum. Na canção que segue, a cantora dá show e passa, com espírito, a canção Ele é por mim (disco Quebrantado Coração, de 2002) que por si só já é especial: a canção trata das vezes que estamos sozinhos e como a Divina Companhia é maravilhosa, fiel e poderosa, além de ressaltar as característica do Senhor Jesus, quem mudou a história do mundo. Dou um destaque especial ao refrão da música e às palavras de Fernanda, no final do clipe: tocantes e de arrepiar! Ouçam em alto e bom som, confiando!!


Quem começou a boa obra é por mim

Aquele que venceu a morte é por mim

Aquele que subiu em glória e mudou a história

é por mim!!

(...)
Eu sei que Ele é por mim

Ele vai a minha frente, ele me defende!

Nunca perdeu uma batalha,

nunca perdeu, nunca perdeu!!

Até a morte ele venceu!!



MUITO FORTE ESSA MÚSICA!!

sexta-feira, 18 de abril de 2014

O HOMEM DUPLICADO (ENEMY)

O Homem Duplicado é um thriller psicológico baseado no livro do escritor português ganhador do Nobel de Literatura, José Saramago, O Homem Duplicado. O livro de Saramago conta a história de Daniel e Antonio, dois homem com uma semelhança perturbadora que acaba por deixar os dois personagens numa situação complicada e única, a da perda da identidade humana. Daniel e Antonio se deprimem e se atormentam diante de um fato tão inédito e que mexe tão profundamente suas identidades como seres humanos, a perda da singularidade. Na obra, Saramago coloca em cheque, mais uma vez, como faz em Todos os Nomes, o papel do homem ante a teia que forma o universo no qual ele está envolto.

Já o filme O Homem Duplicado (Enemy), uma co-produção entre Canadá e Espanha, dirigida pelo canadense Denis Villeneuve (diretor em O suspeito, Incêndios, Redemoinhos entre outros) conta com as participações dos talentosos Jake Gyllenhal (O Segredo de Brocken Back Mountain, Os Suspeitos, Amor e Outras Drogas, Entre Irmãos...), Mélanie Laurent (Trem Noturno para Lisboa, Truque de Mestre, Bastardos Inglórios...), Sarah Gordon (A Casa dos Sonhos, Cosmópolis, Mundo sem Fim...) e uma participação especial de Isabella Rossellini (A Morte de Caim e Abel, Coração Selvagem A Solidão dos Números Primos, Amantes...).

O filme conta a história de Adam e Anthony (Jake Gyllenhal): este é um ator falido, aquele um professor universitário de História que encontra, acidentalmente, assistindo a um filme, um outro homem com características físicas idênticas com as dele (Anthony). Num envolvimento profundo entre os dois que, depois de uma busca intensa, se encontram, o filme tece um drama pessoal, inédito e inexplicável na cabeça dos dois personagens: como pode haver uma outra pessoas com as mesmas características físicas de uma outra pessoa, um caso nunca visto nem entre irmãos gêmeos univitelinos? Os traços psicológicos são os mesmos? O pensamento, a posição diante da vida são os mesmos? Eu sou anormal por isso, por haver uma pessoa idêntica a mim a solta no mundo? Essas e outras questões perturbam e entremeiam a vida dos dois personagens, num silêncio agonizante. A história passa num atmosfera pesada, numa cidade canadense escura e quase sem vida; salvo as duas cenas feitas externamente e os flagras feitos do alto da cidade, o filme todo passa num quadrado com cenas quase monótonas e cinzas e em diálogos duplos. Em algumas vezes, o efeito das câmaras, os sacolejos, e a lucidez das filmagens se fazem sentir; na busca de um realismo forte, o diretor deixa-se perceber com um olhar afinado para as cenas. O telespectador sente-se como alguém que está dentro do espaço da cena (e da trama, que te pega no enredar da história) graças aos enquadramentos impressionantes; muito bom o efeito de câmara do filme!

Para alguns iniciantes, o filme é confuso, sem uma lógica e sem qualquer compromisso com a realidade, aparentando confusão e ilogicidade (principalmente com as aparições intermitentes e confusas de uma aranha em tamanho gigante que povoa a imaginação de Adam!), uma vez que o roteirista e o diretor não deixaram de soltar algumas pitadas de Realismo Mágico, tão forte na literatura de Saramago. Prevendo isso, o diretor epigrafa o filme com uma citação saramagiana "O caus tem uma ordem até então desconhecida", mostrando total logicidade e domínio de roteiro. 

Nos resta falar da beleza de filme, muito bom, muito profundo, interessante, eu recomendo que assistam.




A capa do filme que ficou mais famosa


Segue abaixo um link para ler o livro de Saramago em pdf. 

segunda-feira, 24 de março de 2014

ÚLTIMO CREDO - Augusto dos Anjos


Como ama o homem adúltero o adultério
E o ébrio a garrafa tóxica de rum,
Amo o coveiro — este ladrão comum
Que arrasta a gente para o cemitério!

É o transcendentalíssimo mistério!
É o nous, é o pneuma, é o ego sum qui sum,
É a morte, é esse danado número Um
Que matou Cristo e que matou Tibério!

Creio, como o filósofo mais crente,
Na generalidade decrescente
Com que a substância cósmica evolui...

Creio, perante a evolução imensa,
Que o homem universal de amanhã vença
O homem particular que eu ontem fui


Esse é um dos mais belos poemas de Augusto dos Anjos! Poema cheio de humanismo, o coveiro é a personificação da morte, a principal musa do poeta paraibano: muito mais do que a cor da pele, a raça e a língua, a morte é a única coisa que une a todos os homens, é a única coisa que nos faz todos iguais. Este poema é uma alusão a esse momento tão sombrio e, ao mesmo tempo, tão humano. É a morte que nos faz universais, o homem universal de amanhã que vencerá o homem particular e subjetivo de hoje. "o homem universal de amanhã vença O homem particular que eu ontem fui". O homem que se faz singular neste momento tem um encontro inevitável com o homem universal de amanhã!